Os Borges, o Milton Nascimento, o Fernando e a esquina
18 de abril de 2024

O menino descia correndo as escadas do prédio. Ele tinha uma tarefa: comprar pão e leite para a família e voltar rápido para o apartamento, que ficava no décimo sétimo andar. Ao se aproximar do quarto andar, ele ouviu a voz. Atraído pelo som, Salomão se esqueceu das compras – e por isso recebeu um puxão de orelha da mãe.

Os Borges

Foi assim que Salomão Borges Filho – o Lô Borges – conheceu aquele que se tornaria um dos maiores músicos do planeta: Milton Nascimento. Lô ainda era um menino; Milton iniciava a vida adulta.

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O cenário desse encontro segue de pé, no hipercentro de Belo Horizonte. Construído no começo dos anos 1960, o Edifício Levy era um dos poucos arranha-céus da capital mineira.

Não demorou para Milton Nascimento se tornar um membro informal da família Borges. Primeiro, ele firmou amizade com Marilton. Depois, se tornou o melhor amigo de Márcio Borges, um rapaz que sonhava ser cineasta e era colega de Dilma Rousseff em encontros revolucionários. Belo Horizonte – e o Brasil – viviam um momento complicado. Os jovens músicos viram da sacada do Levy os protestos que levaram ao 1º de abril de 1964.

A parceria de Milton com Lô Borges só foi acontecer bem mais tarde, com o menino já transformado em rapaz. Daí nasceu o disco Clube da Esquina, que mudou a história da música brasileira. Mas nada disso teria acontecido se Márcio não tivesse levado Milton ao cinema.

O Milton

Ele nasceu no Rio de Janeiro, mas leva Minas até no nome: Milton Nascimento era filho de uma empregada doméstica. O pai biológico nunca assumiu o filho e Milton ficou ainda mais sozinho quando a mãe morreu, vítima de tubercuolse.

   

Mas a vida de Milton apontava mesmo para Minas Gerais. Ele foi adotado por Lília e Josino – ela carioca e professora de música; ele mineiro e empreendedor. Após a adoção, a família resolveu voltar para Três Pontas, cidade natal de Josino e onde ele começou um negócio.

Milton cresceu em Três Pontas, onde convivia com apitos de trem e sons rurais. Ali ele fez sua mais antiga amizade: Wagner Tiso, pianista e compositor. Impedido de entrar no principal espaço cultural da cidade por conta da sua cor de pele, Milton ficava do lado de fora, tentando entender o que eram os sons que saíam do Clube Trespontano. Wagner, branco, ficava com o amigo, mas às vezes corria para dentro do clube, via o que estava acontecendo e voltava imediatamente para contar ao Milton.

Apesar do talento precoce na música, por muito pouco Milton não se tornou um burocrata. Foi para isso que ele se mudou para BH, no começo dos anos 1960. Durante o dia ele trabalhava como datilógrafo e se preparava para estudar à noite.

O antigo escritório de trabalho de Milton Nascimento ficava na Praça Sete, a poucos metros do Edifício Levy. Foi para lá que Márcio Borges seguiu.

— Você tem que ir ao cinema comigo. O filme é genial!

Foi mais ou menos isso que Márcio disse sobre o filme Jules e Jim, dirigido por François Truffaut. Os dois amigos foram ao Cine Tupis, que ficava onde hoje está um Shopping, o Cidade. Entraram no cinema às 16h. Saíram três sessões depois, com o relógio da Igreja de São José indicando o avançar da noite.

Estimulados pelo filme, Márcio e Milton foram para a casa dos Borges e escreveram suas três primeiras músicas, que eles chamaram de filhas: Crença, Gira Girou e Novena. Nascia Milton Nascimento.

O Fernando

Márcio e Milton eram inseparáveis. Eles bebiam batida de limão na Praça Sete e na Cantina do Lucas, assistiam filmes no Cine Art Palácio e no Tupis. Eles eram tão próximos que, na ingenuidade da juventude, prometeram: jamais fariam música com outras pessoas. Milton e Márcio se pertenciam e ponto final.

Um dia, Milton Nascimento viu um rapaz de cabelos longos entrando num ônibus. Ele cutucou o passageiro ao lado:

— Eu vou ser amigo daquele cara.

Se Milton disse, estava decidido. Desse jeito começou a amizade e a parceria musical com Fernando Brant. A primeira música foi logo a maior delas. Milton e Fernando se encontraram num bar, na esquina das avenidas Getúlio Vargas e Contorno. Semanas antes, Milton tinha dado uma missão ao novo amigo: colocar uma letra em uma melodia.

A princípio o Fernando recusou, afinal ele nunca tinha feito uma música antes. Por insistência do novo amigo, acabou topando. Fernando entregou a letra num pedaço de papel e correu para o banheiro do bar, com vergonha da reação de Milton. Quando voltou, Milton já tinha encaixado a letra na música. Assim nasceu Travessia.

   

Lô Borges, Fernando Brant, JK, Márcio Borges e Milton Nascimento em Diamantina

A Esquina

Belo Horizonte é uma cidade de esquinas. Toda a área dentro da Avenida do Contorno foi planejada – e o urbanista Aarão Reis optou por um desenho que privilegia os cruzamentos. Qualquer esquina é, no fim das contas, um ponto de encontro – e BH tem muitos lugares assim.

Nesse sentido, BH não poderia ser mais diferente de Brasília, também planejada, mas com escassez de esquinas. Por isso, acho que não é por acaso que um movimento musical chamado Clube da Esquina surgiu na capital mineira.

A história do clube envolve encontros. O encontro do Milton com o Wagner e do Lô com o Milton; do Milton com o Márcio e do Milton com o Fernando – e tantos outros. Foi numa dessas esquinas – numa área não planejada da capital – que a turma ganhou seu nome.

Nessa época, a fama de Milton Nascimento já crescia no Brasil. Os Borges tinham se mudado do Levy para o Santa Tereza, um bairro residencial de ruas pacatas a poucos quilômetros do centro de Belo Horizonte. Os rapazes, que adoravam fazer música, iam para a esquina das ruas Paraisópolis com Divinópolis, pertinho da casa dos Borges.

A esquina ainda está lá, agora com uma placa comemorativa e um bar temático. Mas, quando passamos por lá, é necessário explicar: o Clube da Esquina é mais que aquele pedaço de calçada. É um encontro, um momento extraordinário no tempo que possibilitou que todas essas pessoas estivessem juntas.

Passeio Clube da Esquina

Já contei aqui, mas não custa repetir. Eu organizo uma série de caminhadas temáticas por BH. São passeios literários, gastronômicos, culturais e agora também musicais. A experiência Esquinas do Clube ocorre um sábado por mês, percorre a pé 7 km e para em quatro bares, tudo com muita música, comida e bebida.

Os dois próximos grupos já estão esgotados: dias 27/4 e 4/5. A data de junho ainda não foi definida. Para saber mais, siga o instagram do Movimento BH a pé, projeto que organiza essas caminhadas.

Ainda há vagas para maio, mas em outros passeios: que te levam para conhecer a BH de Carlos Drumond de Andrade, Hilda Furacão e tantos outros.

Aproveita e me segue também lá no instagram: @rafaelsettecamara

Olha o que o Xico Sá falou do meu livro!

Vou aproveitar este email para te contar uma coisa incrível: o jornalista e escritor Xico Sá leu meu livro, o romance “Dos que vão Morrer, aos mortos”, publicado pela Editora Urutau”. Como faço pra dar conta de uma avaliação dessas, gente?

   

O livro fala sobre luto. É a história de uma mãe que atende um telefonema, larga as panelas no fogo e sai de casa. O corpo dela é encontrado em outra cidade, trinta e seis horas depois, e a morte violenta permance sem explicação.

É um livro sobre o filho que tenta entender a dor e seguir em frente, um romance de formação perante essa morte. Um livro sobre minha própria vida: embora seja 100% ficção, meu romance é baseado em minhas dores, lutos e medos. Ele surgiu da morte de minha mãe, que se confunde com a da personagem da trama. Sim, essa é uma história pesada, mas cheia de amor e saudade.

Você pode comprar o livro na Amazon, no site da Editora ou diretamente comigo – o que eu prefiro.

É que eu recebo uma fatia maior em casos de compras diretas comigo, então dessa forma você me ajuda a seguir escrevendo e a já começar a trabalhar no próximo livro.

Em troca, eu te mando o exemplar com uma dedicatória super especial. Quer o seu? Segue o passo a passo:

  • Responda este email e informe seu endereço com CEP, para entrega dos Correios.
  • Informe também o nome que vai na dedicatória. É o seu? É presente? É seu nome ou seu nome e sobrenome?
  • Se quiser adiantar, pode fazer o pix para a chave rafael7camara@gmail.com – esse é meu email pessoal e a conta está em meu nome.
  • O valor é R$ 70 (R$ 60 do livro + R$ 10 para o frete dos Correios).
  • Ficou com alguma dúvida? Coloca no email também!
   

Sobre o autor

Sou de Belo Horizonte e cursei Comunicação Social na UFMG. Jornalista, trabalhei em alguns dos principais veículos de comunicação do Brasil, como TV Globo e Editora Abril.

Sou cofundador do site 360meridianos e aqui escrevo sobre viagem e turismo desde 2011. Na literatura, você me encontra nas coletâneas “Micros, Uai” e “Micros-Beagá”, da Editora Pangeia; “Crônicas da Quarentena”, do Clube de Autores; e “Encontros”, livro de crônicas do 360meridianos.

Em 2023, publiquei meu primeiro romance, a obra “Dos que vão morrer, aos mortos”, da Editora Urutau.

Fonte: 360 Meridianos

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