Representantes do governo, pesquisadores e sociedade civil debatem soluções para saneamento em Seropédica
14 de fevereiro de 2020

Representantes do governo, pesquisadores e sociedade civil debatem soluções para saneamento na Região Metropolitana do Rio

Seminário “Confluir”, do Comitê Guandu-RJ, reuniu representantes do governo, do sistema de gestão de recursos hídricos e sociedade civil para traçar caminhos para o avanço na agenda do abastecimento.

Mais de cem pessoas estiveram presentes no Salão Azul da UFRRJ, em Seropédica/RJ, nesta quinta-feira (13), para discutir abastecimento e esgotamento no Rio de Janeiro. O Seminário Confluir destacou o papel dos atores no avanço da cobertura do saneamento e, com a base técnica de pesquisadores, as soluções para garantia da segurança hídrica. Evento foi uma oportunidade da troca de perspectiva entre governo, pesquisadores e representações da sociedade.

 No painel da manhã, representantes do INEA, Secretaria de Ambiente e Sustentabilidade do Estado do Rio (SEAS/RJ), Agenersa e a Associação de Municípios Fluminenses (AEMERJ), discutiram o papel dos entes governamentais, a forma como se procede o abastecimento da Região Metropolitana e o que deve ser feito para garantir a segurança hídrica, resolvendo os problemas que, segundo muitos dos painelistas, é antigo. “A questão é que o problema chegou no Leblon.

Queimados sempre viveu com problemas de abastecimento e isso nunca foi uma crise”, destacou o professor e pesquisador da UFRRJ, Décio Tubs, que também é membro do Comitê Guandu-RJ. Ele fez questão de destacar na mesa os esforços e apontamentos que o Comitê destaca há anos, sobre a garantia do abastecimento. “Faltou vontade política”, completou.

Edson Falcão, Assessor da SEAS/RJ, apresentou o plano de segurança hídrica do estado que prevê ações para garantir o abastecimento. Hélio Vanderlei, diretor de segurança hídrica e qualidade do INEA destacou um diagnóstico realizado pelo INEA para entender os gargalos na execução os orçamentos em esgotamento entre Comitês, INEA e agência delegatária. Ele, que durante anos foi membro do Comitê Guandu-RJ, falou da aproximação do órgão gestor com os Comitês e a busca de soluções. “Precisamos saber onde os processos não avançaram e quando deve se dar a descentralização dos Comitês para a execução de ações de saneamento. A intenção é fazer o investimento chegar na ponta, ver o pescador e sentindo a diferença no rio”, destacou.

Em vários momentos, mesa e participantes destacaram o papel e até a designação constitucional dos municípios em dar a correta destinação ao esgoto gerado nas suas cidades. Luiz Antonio Neves, prefeito de Piraí/RJ e presidente da Associação de Municípios do Rio de Janeiro, falou sobre a dificuldade das gestões municipais em tratar o tema. “Os municípios ficam com a menor fatia dos tributos.

Além da baixa arrecadação, considerando que a maioria são municípios pequenos, a legislação impõe condições impossíveis para que as prefeituras consigam apoio financeiro para implementar políticas e realizar obras de saneamento. Mas ainda há outras questões: quem vai operar? Quem vai pagar o corpo técnico de funcionários técnicos para que as estações funcionem? Hoje, os prefeitos trabalham no teto da lei de responsabilidade fiscal, é preciso repensar a lógica e o modo de repasse atual”, explicou o prefeito.

O entendimento geral era de que é impossível garantir a qualidade da água, sem esgotamento. Segundo o Plano Estratégico de Recursos Hídricos do Comitê Guandu-RJ, menos de 1% do esgoto produzido por 14 dos 15 municípios da bacia, é tratado. Devido a baixa qualidade da água que chega na captação, o desafio do tratamento é cada vez maior. Carlos Pessoa, engenheiro da Agenersa, falou sobre o trabalho da agência em relação a CEDAE e apontou como uma das soluções o pagamento pelo esgoto tratado, pelo consumidor.

Outro ponto de destaque dos debates da manhã foi a construção do dique, que desviaria o esgoto da lagoa do Guandu, que recebe 56 milhões de litros de esgoto por dia de Nova Iguaçu e Queimados, para um ponto onde não passaria pela captação. A Associação de Pescadores do Pantanal Iguassuano se mostrou preocupada com a obra. “Estamos há três semanas sem pescar e a população não quer mais comprar nosso peixe. Estamos falando de sobrevivência. Quem garante que haverá peixes no trecho que irá receber todo esse esgoto. E quem vai garantir a sobrevivência das famílias que necessitam do pescado”, questionou Vitor Ambrozini, presidente da Associação.

Sobre essa Questão, Miguel Alvarenga, presidente da Associação de Engenharia Sanitária e Ambiental do Rio de Janeiro, sem entrar no mérito de ser ou não uma solução para o problema de qualidade da água, explicou aos pescadores: “A ETA Guandu-RJ foi construída na década de 50 quando, infelizmente, não haviam tantas preocupações com impactos ambientais. Hoje, a ETA devolve para o rio todo o rejeito que fica do tratamento, então, esse desvio, não fará tanta diferença na qualidade da água a jusante da lagoa”    , explicou.

Já o painel da tarde, “caminho das águas: soluções para a segurança hídrica”, reuniu grandes pesquisadores em um debate sobre as soluções e a eficácia do sistema de gerenciamento de recursos hídricos. Rosa Formiga (UERJ), Juliana Fernandes (AGEVAP), Jerson Kelman (COPPE/UFRJ), José Arimathea (IFRJ e FFCBH), provocados pelo jornalista e gestor ambiental Emanuel Alancar, debateram com os membros do Comitê e os presentes, questões técnicas e de gestão para o avanço do saneamento.

Jerson Kelman, que participou da elaboração da Política Nacional de Recursos Hídricos (Lei Federal 9433/97), destacou um estudo que aponta que o custo do saneamento é de cinquenta centavos per capta, e que o Estado precisa atrair investidores para avançar nesta agenda: “não existe fada do saneamento. Tem que dar retorno, ou ninguém faz”, brincou o pesquisador. Além disso, sobre as dificuldades fiscais de municípios e empresas, de modo emergencial, ele sugeriu criar contas específicas para projetos para que o investimento em saneamento não fosse afetado por qualquer problema fiscal ou financeiro dos municípios ou das empresas. “Cria uma conta específica para as obras e deixa o investimento lá, de forma que o desembolso aconteceria de acordo com a execução, sem estar vinculado a outros problemas financeiros”, sugeriu Kelman, apontando esse arranjo como uma das saídas.

A pesquisadora Rosa Formiga (UERJ) apontou os desafios em um conjunto de soluções que abrangem esgotamento, proteção de mananciais, infraestrutura verde e educação ambiental. Outra questão levantada pela especialista foi o importante papel dos Comitês de Bacias e seus instrumentos de gestão e o destacou como o órgão, designado pela lei, para resolver os conflitos pela água em primeira instância. “As decisões devem começar aqui. O colegiado é o local onde as representações pactuam as soluções.

Isso precisa ser potencializado do ponto de vista de política pública, partindo de quem tem conhecimento e é diretamente atingido pelas decisões”, opinou Rosa Formiga. Outra questão apontada pela pesquisadora é a importância da integração da gestão das bacias. A maior parte das águas do Rio Guandu vem do Rio Paraíba do Sul. Na Elevatória de Santa Ceília, em Barra do Piraí, 60% das águas do Paraíba são transpostas, garantindo a vazão necessária para o abastecimento da Região metropolitana do Rio de Janeiro. “Primeiro ponto a se destacar é que esta é a única transposição gratuita do Brasil. Todas as outras são pagas e em Santa Cecília, as bacias e municípios afetados não recebem nenhuma contrapartida. Outra questão é que o Carioca está entendo hoje que a água que ele bebe vem do Paraíba e uma gestão integrada se faz necessária para que essa água já chegue com boa qualidade”, destacou.

Juliana Fernandes (AGEVAP) apresentou o panorama de esgotamento da bacia. Em paralelo aos problemas, destacou as soluções e também alguns limitantes, e a importância de adequar o aparelhamento do sistema de gestão de recursos hídricos a demanda e ao amadurecimento dos comitês. “Hoje, as delegatárias, ditas agências de águas, mantém contratos de gestão com corpo técnico semelhante ao de dez anos atrás, ao ponto que os comitês amadureceram, os problemas aumentaram e as demandas cresceram. Precisamos rever os contratos e criar aparato técnico e administrativo para evoluir na execução dos projetos. Outro ponto interessante é entendermos o papel das delegatárias dentro do sistema para não perdemos tempo e esforços em tarefas não previstas no contrato de gestão”, explicou a diretora da AGEVAP, delegatária de sete dos nove comitês de bacia do estado e da bacia federal do Paraíba do Sul.

Outro participante desta mesa foi José Arimathea, pró-reitor do IFRJ e coordenador geral do Fórum Fluminense de Comitês de Bacias. Com a experiência de já ter sido prefeito, Arimathea destacou as limitações que as gestões municipais têm em realizar obras de saneamento e apontou os Comitês como os órgãos ideias para tocar essa agenda, porém, precisam de arranjos institucionais que agilizem a concretização das ações. “Os Comitês têm dificuldade de chegar nos municípios. O Estado precisa pensar em meios de dar autonomia aos Comitês e delegatária para de fato resolverem o problema do saneamento, sem necessariamente depender de certidões das cidades”.

A mesa da tarde foi provocada pelo jornalista e gestor ambiental Emanuel Alencar. Com a experiência de ter trabalhando em grandes veículos, cobrindo a pauta de meio ambiente, o profissional colaborou trazendo à discussão os pontos de interesse da sociedade. “Ao trazer uma série de atores para discutir o problema de forma transparente, o Comitê cumpre sua função fundamental que é criar pactos e arranjos técnicos e políticos para melhorar os índices vexatórios de tratamento de esgoto do Estado. Foi um enorme prazer contribuir para que o assunto ganhe corações e mentes de toda sociedade. É a função do comunicador reduzir o espaço entre a informação técnica e toda população”, declarou o jornalista após o evento.

As opiniões do seminário não vieram só dos painelistas. Pescadores, Membros do Comitê, secretários municipais, estudantes e outras representações participaram ativamente, trazendo contribuições, fazendo questionamentos e esclarecendo entendimentos para que as soluções traçadas fossem cada vez mais viáveis e abrangentes. “A intenção é buscar soluções que sejam tangíveis”, explicou o diretor Geral do Comitê Guandu-RJ.

A plenária do Comitê voltará a se reunir no dia 4 de março. Na pauta a criação de uma câmara técnica de saneamento básico que vai tratar exclusivamente desta agenda, criando meios de fazer com que os investimentos cheguem na ponta.

Fonte: AGEVAP