História Agraria no período de 1850 a 1885 quando Seropédica fazia parte da Fazenda Santa Cruz
16 de outubro de 2021

A povoação da região da atual Baixada Fluminense teve seu início com as doações de sesmarias realizadas pela Coroa no final do século XVI, como a grande sesmaria doada a Baltazar da Costa entre os rios Marapicu e o Guandu em 1593 com 9.000 braças. Os governadores doavam as terras para fomentar o povoamento, mas, de uma maneira geral “a primeira demonstração de atividade colonizadora era a capela, célula da embrionária aldeia, freguesia, vila ou cidade”.

A partir dessas primitivas capelas, posteriormente elevadas a curatos, que se desenvolveram os povoamentos da região. Sob a vigilância dos vigários se tornavam agrupamentos urbanos devido às atividades comerciais.

Outra característica do povoamento da região era o caráter comercial das chamadas “vilas comerciais”, como é o caso, por exemplo, de Iguaçu, surgida a partir de rotas comerciais que cruzavam a região. Itaguaí encontra-se sob a mesma influência, não em sua formação original, mas em seu desenvolvimento posterior e consequentemente sua futura decadência, no fim do século XIX. Havia nesses núcleos populacionais uma instabilidade, pois estavam economicamente dependentes da rota comercial. Com a surgimento da estrada de ferro entrariam em uma profunda decadência social e econômica.

A história de Itaguaí, município fluminense, é remontada a partir da fixação de uma aldeia de indígenas fundada por Mem de Sá inicialmente em uma localidade chamada Itinga, depois transferida para o sul do município, próximo ao mar, por orientação dos missionários da Companhia de Jesus, em meados do século XVII. Posteriormente, os religiosos construíram, em 1729, a capela em devoção a São Francisco Xavier. 

Elevada a freguesia em 15 de novembro de 1795 com o nome de São Francisc Xavier e depois sendo alçada ao patamar de vila através do alvará que criou o município em 5 de junho de 1818, sendo efetivado em 1820, Itaguaí “cujo o território e limites deverão compreender a Freguezia de Itaguahy do alto da serra para a vargem, a Freguezia de Marapicu, do rio Guandú subindo até a parte esquerda, todo o Ribeirão das Lages e a freguesia de Mangaratiba.”

Compreendendo a parte meridional do estado do Rio de Janeiro, o território de Itaguaí na segunda metade do século XIX compreendia 428,90 quilômetros quadrados já tendo sido desmembrado de Mangaratiba. Os rios da região, importantes rotas de escoamento da produção do Vale do Paraíba e da própria região no século XIX, eram os rios Guandú, Guandú-mirim, Itaguaí, Ribeirão das Lages e Macacos. É importante perceber que estamos falando não do município de Itaguaí dos dias atuais que compreende em seu território 275,870 quilômetros, mas sim, de uma Itaguaí que tinha em seu território as localidades que hoje são os municípios de Seropédica e Paracambi.

Na segunda metade do século XIX o município de Itaguaí estava dividido em três freguesias: São Francisco Xavier, conhecida também como a freguesia da vila, São Pedro e São Paulo do Ribeirão das Lages e Nossa Senhora da Conceição do Bananal (Bairro Jardim Maracanã).

As duas últimas eram separadas por uma estrada. Estas freguesias se diferenciavam em
suas dimensões geográficas e pelo tipo de cultura praticada por seus fazendeiros. Fazia
parte do território do município também a Ilha da Madeira, com sua população de menos de mil habitantes no século XIX, voltada para a cultura de cereais e verduras para o abastecimento da vila de são francisco Xavier que tinha em seus limites as povoações de Mazomba, Coroa Grande e Leandro.

Nossa Senhora da Conceição do Bananal ficava ao norte do município na margem direita do Rio Guandu, tendo o início da construção de sua capela em 1838, sendo elevada a curato do Bananal em 1846 e em 1851 à freguesia, através do decreto n° 549 de 30 de agosto. Suas povoações compreendiam Mangueiras, Saco da Prata, Patioba e Coroa Grande.

Em 1879 o Amanak Laemmert calculou a superfície da freguesia da vila de São Francisco Xavier em 155,70 quilômetros quadrados, chegando ao número de 23 habitantes por quilômetro quadrado. A população livre era de 3.534, e dos 33 eleitores do município, 13 são listados nesta freguesia.

A freguesia de São Pedro e São Paulo do Ribeirão das Lages foi criada por lei provincial n. 77 de 29 de dezembro de 1836. Sua população livre era de 2.808 pessoas, entre estes, 10 eleitores nos anos 1880. No início da segunda metade do século XIX era a freguesia que tinha uma vasta relação de ofícios exercidos por seus moradores. Sua constituição administrativa em 1850 era composta por Subdelegado de polícia, Juiz de Paz, vigário, boticário, negociantes, entre outros.

Além disso, em São Pedro e São Paulo existia uma gama variada de ofícios e estabelecimentos como padarias, alfaiates, sapateiros, barbeiros, ferreiros, pedreiros,
carpinteiros, marceneiros, ourives, fabricante de velas, veterinários, tamanqueiros,
correeiro, fogueteiro e açougues. Ela era a principal freguesia produtora de café em
Itaguaí nos anos 1850. Já em 1880 esta freguesia aparece com sua superfície calculada
em 59 quilômetros quadrados, perdendo grande parte de suas terras quando é criada a
freguesia de Nossa Senhora da Conceição do Bananal (Jardim Maracanã em Seropédica).

Fazendeiros e Lavradores desta regiões

Para realizar esta análise utilizei os dados do Almanak Laemmert e do Almanak Administrativo, Mercantil e Industrial da Corte e Província do Rio de Janeiro que traziam informações das três freguesias de São Francisxo Xavier de Itaguaí. Esta metodologia foi realizada por Rubens da Motta Machado, para o município de Nova Iguaçu, incluindo a freguesia de Marapicu que fazia fronteira com a freguesia de Nossa Senhora da Conceição do Bananal.  

O Almanak Laemmert teve sua circulação entre os anos de 1849 e 1889. Nosso período de análise desta fonte ocorre entre os anos de 1850 e 1885, último ano que encontramos informações sobre as freguesias de Itaguaí, a partir deste ano, não foram publicadas informações sobre o município na seção Províncias do Almanak Laemmert.

Na seção “Províncias” encontramos uma lista com os nomes dos fazendeiros e lavradores de cada freguesia de Itaguaí subdivididos de acordo com o tipo de cultivo praticado em suas propriedades. Temos também informações sobre a composição da Câmara Municipal, subdelegado de polícia, juizado municipal e de órfãos, inspetores de quarteirão, vigário, casas de caridades, os vapores que faziam a navegação de Itaguaí para o porto do Rio de Janeiro, além de detalhar alguns tipos de estabelecimentos comerciais como boticários, trapiches, veterinários, hotéis e hospedarias, entre outros.

Em suma, ele nos dá uma noção geral de como era composta a estrutura social de cada freguesia, além de alguns nomes que compunham a administração do município, informações fundamentais para começarmos a pensar o que era Itaguaí na segunda
metade do século XIX e suas principais características como uma vila situada em sua grande parte nas terras da Fazenda Imperial de Santa Cruz.

As listas eram realizadas por emissários locais o que nos permite supor que as
categorizações realizadas nas listas partissem de uma compreensão que eles tinham
sobre si mesmos e, portanto, expressavam os espaços que imaginavam ocupar socialmente.

Observando essas listas tivemos a oportunidade de compreender quantitativamente a dimensão em que era plantado o café, a cana, e outros tipos de plantios destinados ao mercado interno e verificar a proporção em que isso se manteve ao longo do período estudado, ou suas variações. O que podemos verificar foi a diminuição do número de fazendeiros que tiveram seus nomes publicados nas páginas do Almanak Laemmert a partir dos anos de 1870.

Precisamos ter sobre esta fonte, diante de suas limitações e dúvidas a respeito da
confiabilidade de seus dados, uma atenção redobrada. Por mais que pudéssemos supor
que a diminuição na quantidade de nomes de fazendeiros correspondesse, consequentemente, a uma diminuição real das unidades produtivas que se dedicavam ao
café, não poderíamos afirmar com certeza. 

O primeiro ponto que abordamos para tentar elucidar a questão diz respeito ao pagamento, efetuado ou não, pelos fazendeiros e lavradores que tinham seus nomes publicados nas listas do Almanak Laemmert. Rubens da Motta Machado entendeu que esse pagamento não fosse necessário, portando, os fazendeiros e lavradores não eram obrigados a pagar para a inclusão dos seus nomes naquelas listagens publicadas anualmente.

O Almanak Administrativo, Mercantil e Industrial da Corte e Província do Rio de Janeiro era impresso pela “Typographia Universal de E. & H. Laemmert” situada na Rua dos Inválidos, n° 61B no centro do Rio de Janeiro, portanto, a mesma que publicava o Almanak Laemmert.

Suas edições, inclusive, traziam as mesmas informações, em alguns momentos, temos a impressão de estar lendo as páginas do Almanak Laemmert, quando na verdade, eram as páginas do Almanak Administrativo, Mercantil e Industrial da Corte e Província do Rio de Janeiro. Foi justamente nas páginas deste último que encontramos a lista de assinantes do município de Itaguaí no ano de 1865.

Essa edição informava na página de capa que se tratava do 22° ano de publicação
do Almanak Administrativo Mercantil e Industrial da Corte e Província do Rio de
Janeiro. Os dois almanaques foram fundados por Eduardo von Laemmert “cônsul de sua
Alteza Real e Grão-Duque de Badem”.

Estamos trabalhando com a hipótese que a lista de assinantes era igual para as duas publicações, por serem dos Irmãos Laemmert, produzidos no mesmo lugar, e foi possível encontrar em centenas de páginas das duas publicações as mesmas informações sobre os municípios e seus fazendeiros e lavradores. Provavelmente o assinante pagava pela assinatura já sabendo que estaria contribuindo para as duas publicações, e o título da lista dos assinantes que eram de vários municípios do Rio de Janeiro, Minas Gerias, São Paulo, os chamavam de “Senhores Assignantes – Protectores desta empreza.

Buscando compreender melhor quem eram os fazendeiros e lavradores de Itaguaí cruzamos a lista de assinantes publicada no Almanak Administrativo com a lista de fazendeiros e lavradores publicada no Almanak Laemmert e verificamos que dos 53
assinantes, 17 também estavam listados como fazendeiros e lavradores domunicípio.

Portanto, podemos concluir que não havia uma relação entre a assinatura e o nome exposto naquelas listas. Foi possível perceber também que dos 17 listados no Almanak Laemmert, 15 tinham suas terras na freguesia da Vila de São Francisco Xavier, os outros dois tinham suas terras na freguesia de Nossa Senhora da Conceição do Bananal.

Foi o caso do Capitão e presidente da Câmara Luiz José Lopes, na freguesia do Bananal, classificado como “Fazendeiro e principais Lavradores de Café” em 1870.

Temos praticamente todos os fazendeiros assinantes listados no Almanak Laemmert com suas terras na freguesia da Vila. Veremos mais à frente este ponto detalhadamente. Entre os 17 assinantes, temos seis que são listados no Almanak Laemmert como “Proprietários”, isso significa que eles eram os donos das terras cultivadas, mas não necessariamente eram os que efetivamente utilizavam a terra para o plantio, ou mesmo que residissem em Itaguaí, o que pode explicar a ausência deles na lista de eleitores em 1865. 

Outro dado que nos chama atenção sobre estes indivíduos são os que têm patente da Guarda Nacional, somam 15, entre Tenente, Capitão, Major, e temos também dois comendadores, Manoel José Cardoso, que chegou a acumular os cargos de presidente da Câmara, tenente- coronel da Guarda Nacional, negociante e 1° juiz de paz da vila, e Antonio José de Oliveira Sampaio, além dos barões de Itaguaí e Ivaí.

No Relatório do Presidente da Província encontramos a presença de três assinantes que
foram vereadores no quatriênio (1857-1860) é o caso do Alferes José Luiz Lopes, o
Major Antonio Vicente Danenberg e Raymundo Antonio Teixeira.

Em 1865 Itaguaí possuía 68 eleitores que estavam distribuídos pelas freguesias da seguinte maneira: 30 eleitores na freguesia da Vila de São Francisco Xavier, 23 na freguesia do Bananal, e 15 na freguesia de S. Pedro e S. Paulo. Entre os 13 assinantes eleitores, apenas oito aparecem nas páginas do Almanak Laemmert nas categorias de Fazendeiro de Café, Fazendeiros de Café e Principais Lavradores, Cultura da Cana e Fazendeiros de Criação. Na tabela a seguir podemos observar os fazendeiros que são eleitores no município de Itaguaí e assinantes do Almanak Laemmert e como eles se distribuem pelas três freguesias de Itaguaí. É possível notar a concentração deles na freguesia da Vila de São Francisco Xavier.

Após compreendermos melhor a composição dos assinantes do Almanak Laemmert, vamos continuar buscando respostas para a diminuição na quantidade de nomes de fazendeiros e lavradores naquelas listas, assim tentaremos entender a questão a partir da mudança de status.

Analisando as listas de fazendeiros e lavradores do município de Itaguaí publicadas anualmente pelo Almanak Laemmert, foi possível observar que, nos últimos anos de amostragem, em um processo iniciado nos anos 1870, as categorias dos fazendeiros de café e cana diminuem progressivamente até o ano de 1885. Por outro lado, há um aumento dos fazendeiros e lavradores que não tem uma especificação sobre o que cultivavam. Acredito que isso esteja ligado à crise econômica que passava o município, crise esta que não tem uma única origem.

Esta observação nos leva a outra questão: o caráter de policultura presente nessas unidades produtivas, principalmente nos anos 1880. Assim, podemos afirmar que com a
diminuição da cultura do café e em algum grau o da cana, destinada principalmente a
fabricação de aguardente, há o aumento das terras utilizadas para o plantio de gêneros
alimentícios.

É importante frisar que a policultura sempre existiu, o que estamos afirmando é a sua ampliação no espaço deixado pela diminuição do plantio do café. Assim, tentaremos perceber até que ponto a diminuição das plantações de café ou de cana significava efetivamente uma crise para os pequenos e médios fazendeiros.

Era preciso compreender até que ponto aqueles indivíduos conseguiram sobreviver à
crise, ou pelo menos amenizar seus efeitos, evitando a extinção da sua produção através
da diversificação do que era plantado em suas terras. 

A partir de 1880 percebemos que as listas do Almanak Laemmert não especificam
claramente o que era plantado em cada propriedade, optando-se então, para
nomenclaturas mais genéricas como “mantimentos”, “cereais”, ou mesmo sem nenhuma
referência no título da lista, apenas nomeadas como “proprietários”, “lavradores”, etc.

Acreditamos que esta mudança se dê como reflexo do aumento de propriedades que se
dedicam a vários tipos de plantações. Como pista para compreender esta questão, temos vários casos de fazendeiros de café que ao longo da amostragem começam listados como “fazendeiros de café” e terminam como “lavradores de café e outros mantimentos”. Esse é o caso de Antonio Alves de Oliveira Lima que aparece em 1850 como fazendeiro de café na freguesia de São Pedro e São Paulo do Ribeirão das Lages.

Já em 1855, Antonio Alves de Oliveira Lima aparece na categoria “Fazendeiros e principais lavradores de café” na freguesia de Nossa Senhora da Conceição do Bananal. Em 1860 e 1870 Antonio Alves de Oliveira Lima aparece novamente na categoria de “Fazendeiros e principais lavradores de café”, não aparecendo na lista de 1865. E partir de 1875 ele é listado na categoria “Fazendeiro de café e outros mantimentos” na freguesia do Bananal.

Dois detalhes nos chamam a atenção sobre a modificação da categoria em que Antonio Alves de Oliveira Lima aparece no Almanak Laemmert ao longo da amostragem.

O primeiro é sobre a inexistência desta categoria nos anos iniciais de amostragem, evidenciando a necessidade de ajustamento do título da categoria ao que era plantado em cada fazenda, lembrando que esta categorização partia da compreensão que os fazendeiros e lavradores tinham sobre eles mesmos.

O segundo detalhe que essa mudança nos mostra sobre esses “mantimentos”, provavelmente plantados para o consumo de subsistência, agora, ganhavam importância, pois começam a ser mais um meio de produção para a fazenda que enfrentava problemas com a produção do café.

Portanto, aparecer pela primeira vez na categoria “Fazendeiro de café e outros mantimentos” em 1875, justamente no período em que há uma diminuição no número
total de fazendeiros dedicados ao café e o aumento de fazendeiros que não tem sua
produção especificada é muito significativo. Antonio Alves de Oliveira Lima estava,
provavelmente, em uma momento de transição, onde a monocultura cafeicultora perdia
espaço para uma maior diversificação do que era plantado e comercializado nas propriedades.

Acreditamos que no início dos anos 1850 os gêneros alimentícios eram plantados, principalmente, para o consumo próprio e, por isso, não tendo repercussão econômica significativa para constar nas listas do Almanak Laemmert. Já partir dos anos 1870 essa produção é expandida para além da produção de subsistência das fazendas e ganha o mercado interno, sendo necessária a variação da categoria do Almanak Laemmert que aparentemente tentava dar conta desta diversificação na produção agrícola local.

Nos anos 1880 Antonio Alves de Oliveira Lima aparece em duas categorias, a primeira é a mesma que apareceu durante a amostragem anterior na freguesia do Bananal como “Fazendeiro de café e outros mantimentos”. Agora, também aparece em uma nova categoria “Lavradores de café e cereais” na freguesia da vila de São Francisco Xavier.

Em 1885, último ano de amostragem, ele aparece somente na categoria “Lavradores de
café e cereais” na freguesia da vila de São Francisco Xavier. Este é um dado revelador,
pois se estamos tentando perceber algum tipo de crise pela qual passou a região,
percebemos o ano de 1875 como um marco do declínio da principal produção agrícola
de Itaguaí.

Ter Antonio Alves de Oliveira Lima mudando de categoria justamente na década de 1870 e no último ano de amostragem, 1885, demonstra uma mudança no perfil do que era plantado em Itaguaí. Sua fazenda em Bananal não aparece mais listada em 1885, constando apenas sua plantação de café na freguesia na vila de São Francisco Xavier. É possível observar que durante a segunda metade do século XIX Antonio Alves de Oliveira Lima surge nas listas como “Fazendeiros de café” e termina como “lavradores de café e cereais”.

Este processo de mudança de status de fazendeiro para lavrador ocorre nas três freguesias de Itaguaí. Podemos citar o caso de Antonio Dias Pavão Araujo, vereador, 2° substituto do juiz municipal e moço fidalgo da Casa Imperial.

Ele surge na amostragem apenas em 1865 como “fazendeiro de café” na freguesia da vila de São Francisco Xavier, repetindo a categoria em 1870, ano em que tivemos o maior número de propriedades dedicadas ao café listado em todo o município. Mas, em 1875 ele é classificado como “lavradores de café e cereais”, sendo listado pela última vez na mesma
categoria de lavradores em 1880, mas não constando na amostragem de1885.

O ano de 1885 foi aquele em que a quantidade total de fazendeiros e lavradores diminuiu, mesmo havendo aumento no número de propriedades sem especificação da sua produção. Poderíamos supor que Itaguaí entrou em um período muito difícil economicamente, o que provocou o fim de muitas plantações, o que explicaria o fato de Antonio Dias Pavão Araújo não aparecer na listagem de 1885.

Nas páginas do Almanak Laemmert, para o ano 1885, existe uma descrição do
município, que reforça nossa hipótese de empobrecimento em Itaguaí durante a crise da
mão de obra escrava.

“Este município é de excellentes terras que se prestão a qualquer cultura, porem, a falta de braços o faz extremamente decadente, e proximamente ficará sem via de comunicação para a corte, porque de dia para dia se danifica consideravelmente o aterrado que daqui vai
para Santa Cruz”. 

As considerações sobre as condições em que se encontrava Itaguaí são feitas apenas quatro anos antes do falecimento de Francisco Antonio Soares da Silva, e deixavam claro que o município passava por uma crise, provavelmente iniciada com o progressivo encarecimento da mão de obra escrava.

Manoel Batista do Prado Junior, ao estudar a localidade de Mangaratiba afirmou que, com o avançar do século XIX, houve um aumento da concentração da mão de obra escrava, e uma concentração também fundiária. Em Mangaratiba a crise desta mão de obra vai atingir primeiro os pequenos e médios proprietários. 

Os pequenos lavradores acabavam vendendo seus escravos e, por vezes, suas terras, para os maiores proprietários. Manoel Batista do Prado Junior afirmou ainda que foi possível perceber os grandes proprietários, já nas últimas décadas do XIX, sendo também diretamente afetados pela crise, e sem ter como renovar o plantel devido à lei de 1871. 

Dos inventários analisados até o momento para Itaguaí na década de 1850, o que podemos constatar é que, em muitos casos, o maior bem daqueles fazendeiros e lavradores era justamente a mão de obra escrava. Nos autos dos inventários, os escravos aparecem com valor total chegando, em alguns casos, ao dobro do montante referente às plantações de café.

Para entender esse impacto, recorremos inicialmente aos dados publicados no Almanak Laemmert começamos a compreender a distribuição das propriedades em Itaguaí por tipo de cultura, entre os anos 1850 e 1885. 

Em 1850, 88% do total de propriedades listadas no Almanak Laemmert se dedicavam ao café. Já os que plantavam cana correspondiam a 12% do total. Já em 1855, o número de fazendeiros e lavradores de café sobe para 96%, enquanto o número de fazendeiros dedicados à cana e/ou açúcar representam aproximadamente 4%.

O intervalo 1860 – 1865 é o primeiro ano em que não há crescimento no número de
fazendeiros de café em Itaguaí, cai de 226 para 201. Jonh Shulz, em a crise financeira da abolição, realiza uma análise das crises que afetaram o café no Brasil, o autor afirma que o ano de 1864 foi muito difícil para os fazendeiros de café do Vale do Paraíba, as terras perderam fertilidade, a produção estagnou, uma praga atingiu os cafezais e o preço no mercado internacional caiu devido a guerra civil americana, e como o interior do Rio dependia do café o dinheiro se tornou cada vez mais escasso. 

O último ano em que conseguimos informações sobre as propriedades do município de Itaguaí foi 1885. Notamos que não só os que se dedicam ao café têm seu número total reduzido, mas os que se dedicam à cana também.

Há uma redução em todas as categorias, demostrando que houve uma diminuição de fazendeiros e lavradores no município de Itaguaí entre os anos de 1870 e 1885 envolvidos com os dois tipos de plantio. Ao passo que surgem uma grande quantidade de agricultores que não tem especificado o tipo de cultura praticada.

Quando observamos o gráfico a seguir, que demostra a evolução dos fazendeiros de café e cana em todo o período da amostragem, conseguimos ter uma visão mais clara do que estamos dizendo.

Entre os anos de 1850 e 1855 observamos um aumento na quantidade de fazendeiros e lavradores de café, de 106 para 169. Ao longo dos anos 1855 e 1860, mais um aumento, de 169 para 226. Há uma redução em 1865, passando para 201, mas se recuperando em 1870, tendo seu maior valor de toda a amostragem. A partir deste ponto há uma progressiva diminuição, sem recuperação chegando ao resultado mais baixo em 1885.

A partir de 1875 os fazendeiros de café ao serem listados no Almanak Laemmert começam a ter seu cultivo associado a outros. De um total de 130 propriedades que se dedicavam ao café, 108 aparecem como “fazendeiros de café e cereais”, ou “fazendeiros de café e outros mantimentos” e apenas 22 estão na categoria “fazendeiros de café”. Já nos anos de 1880 e 1885 todos os fazendeiros de café são listados em categorias que associavam o café à cereais ou outros mantimentos sem especificar quais seriam.

Os engenhos e engenhocas do município têm seu somatório mais baixo em 1855, mas, nas amostragens seguintes, conseguem dobrar em número de fazendeiros e lavradores dedicados a cana e seus derivados, chegando ao seu máximo, e em 1875, com 58 propriedades. Mas, a partir de 1880 tem uma diminuição em seis propriedades, acompanhando a queda do café.

Percebemos através dos inventários post mortem analisados que nos anos de 1850
os engenhos e engenhocas estavam voltados principalmente para a produção de açúcar.
Mas ao longo dos anos de amostragem, o aumento do plantio da cana se volta em sua
maior parte para a produção de aguardente.

Ao analisar as listas publicadas pelo Almanak Laemmert com nomes dos fazendeiros e lavradores de Itaguaí podemos verificar que ao longo da segunda metade do século a mudança no título dessas listas estava relacionada à necessidade de adequação a produção de cada propriedade ao título da lista.

Assim, se no início percebemos predominantemente fazendas dedicadas ao café. Ao passar das décadas vimos o aumento das fazendas que se dedicam a produção da aguardente.

Outro elemento que podemos verificar foi o fato das listas passarem a incluir à produção
principal a presença de “cereais” e “mantimentos”, o que nos sugere que nas últimas
décadas do século XIX havia uma maior diversificação no que era produzido naquelas
fazendas.

Verificamos também que entre os fazendeiros que tinham seus nomes publicados, vários apareciam ligados a cargos da administação municipal como presidente da Câmara Municipal, vereadores, juiz de paz e órfãos.

Alguns acumulavam os cargos citados com títulos da guarda nacional, além de figurarem na lista de eleitores do município distribuídos pelas três freguesias de São Francisco Xavier de Itaguaí.

Portanto, a posse da terra conferia um status que permitia que estes indivíduos
participarem da vida do município em posições de decião sobre o restante da população.

Fontes consultadas:

Almanak Laemmert, Seção “Províncias”, 1850, 1855, 1860, 1865, 1870, 1880, 1885.
Almanak Administrativo, Mercantil e Industrial da Corte e Província do Rio de
Janeiro, 1865.
IBGE. Sinopse estatística do município de Itaguaí, Rio de Janeiro, 1948.
IBGE – Comissão Nacional de Geografia, 1956.
Relatório do Presidente da Província, 1857.

Bibliografia:

CARRÉ, A.N.; ANDRADE, R.G. de. Estrutura agrária e população escrava na Freguesia
de Nossa Senhora da Conceição do Bananal e seu entorno: Itaguaí, 1808-88. Revista
Universidade Rural: Série Ciências Humanas, Seropédica, RJ: EDUR, v. 27, n. 1-2, p.
107-113, jan.-dez., 2005
SCHULZ, John. A crise financeira da abolição.(1875 – 1901). São Paulo. Editora da
Universidade de São Paulo: Instituto Fernand Braudel, 1996.
IBGE. Sinopse estatística do município de Itaguaí, Rio de Janeiro. 1948.
LAMEGO, Alberto Ribeiro. O Homem e a Guanabara. IBGE. 2° ed. 1964.

ANÁLISE DAS LISTAS NOMINAIS DOS FAZENDEIROS E LAVRADORES DE SÃO FRANCISCO XAVIER DE ITAGUAÍ NAS PUBLICAÇÕES DOS IRMÃOS LAEMMERT (1850 – 1885)

Por: Max Fabiano Rodrifgues de Oliveira
Universidade Feredal Rural do Rio de Janeiro

 

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