Prática denunciada em prédios do Centro do Rio é classificada como arbitrária por advogados, enquanto concessionária nega o corte de serviço e AGENERSA notifica a empresa para apuração

Imagem meramente ilustrativa de trabalhadores da Águas do Rio trabalhando
Após levar parte dos condomínios do Centro do Rio de Janeiro a enfrentarem aumentos estratosféricos nas taxas condominiais — com relatos de elevações de até 160% e casos de 1370% na Rua Dom Gerardo devido às tarifas mínimas de água —, a concessionária Águas do Rio é alvo de novas e graves denúncias recebidas pelo Diário do Rio. A empresa estaria coagindo porteiros e síndicos com a ameaça de tamponar as saídas de esgoto de edifícios inadimplentes, o que causaria o acúmulo de dejetos e o consequente transbordamento para as portarias e calçadas.
A ameaça se materializou com o uso de um artefato, apelidado popularmente de “ROLHA DE BOSTA”: uma espécie de bolha inflável que, segundo relatos, é inserida nas saídas de esgoto e inflada dentro do cano, bloqueando o saneamento. A denúncia aponta que a intenção é fazer com que o esgoto retorne e escorra para o passeio público, ignorando o fato de que o esgotamento sanitário é um serviço essencial.
Implicações Legais e o Marco do Saneamento
A prática é veementemente criticada por especialistas em direito condominial. O advogado Matheus Miranda de Sá Campelo, com escritório em Copacabana, classificou a medida como “despótica, arbitrária e sem amparo jurídico”.
Campelo explica que a prática “afronta pedidos constitucionais e legais, e viola de forma direta os direitos mais básicos do ser humano”. O esgotamento sanitário é reconhecido pelo Marco Legal do Saneamento (Lei 11.445/2007) como um serviço público essencial, “indispensável à vida digna e à saúde pública”.
O artigo 2º da Lei 11.445/2007 estabelece a universalidade do acesso a cada serviço de saneamento básico. Adicionalmente, a Lei 8.987/1995 prevê a “regra da ininterruptibilidade”, ou seja, o serviço não pode ser paralisado. O advogado reforça que a concessionária deve buscar os valores devidos na justiça, e não sujeitar a coletividade ao risco sanitário.
A ilegalidade do tamponamento como medida coercitiva de cobrança já foi enfrentada em tribunais, como em Fortaleza (CE), onde a Corte reforçou que a concessionária deve utilizar os meios “próprios e razoáveis previstos em lei”, sob risco de afrontar os direitos elementares da pessoa e gerar risco grave à coletividade.
Cobrança Abusiva e o Risco de Contaminação Pública

Este Artefato, apelidado de “ROLHA DE BOSTA”, é inserido pelos empregados da Águas do Rio nas saídas de esgoto dos edifícios, bloqueando o acesso ao saneamento básico dos cidadãos, e atrapalhando também os vizinhos / Foto: DIÁRIO DO RIO
A inadimplência dos condomínios é, em grande parte, resultado de uma decisão do STJ que permitiu à Águas do Rio cobrar uma tarifa mínima multiplicada pelo número de unidades, ignorando o consumo real. Isso gera contas de R$ 40 mil, R$ 50 mil ou até R$ 100 mil mensais para prédios com alta vacância. Muitos edifícios têm optado por cortar o fornecimento da Águas do Rio e sobreviver com caminhões-pipa, que chegam a custar 1/8 da tarifa mínima cobrada pela concessionária.
Outro ponto de absurdo é a cobrança de esgoto: a Águas do Rio tem espelhado o valor da tarifa mínima de água na cobrança de esgoto, mesmo que o condomínio não utilize água da rede. A justiça não autorizou este tipo de cobrança por estimativa de esgoto.
O administrador de imóveis Wilton Alves, com 60 anos de experiência, alerta para as consequências do tamponamento: “O tamponamento do esgoto gera uma situação incontrolável, pois, ao contrário da água, as pessoas não têm torneira. […] Isso gera um acúmulo e com isso o retorno do esgoto, que vai escorrer portarias afora, e afetar as calçadas e o passeio público, transformando a cidade num grande lixão. Imagine um prédio que tenha o esgoto tamponado ao lado de um restaurante. Como sobreviverá o restaurante com as pessoas pisando nas fezes pelo chão e entrando restaurante adentro?”, questiona Alves, temendo que a situação resulte em “cocô para todo lado”.
Respostas Oficiais e a Atuação da AGENERSA
A Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da Alerj (CDDHC) informou que está encaminhando ofícios às concessionárias e à agência reguladora após a denúncia do Diário do Rio. A Agência Reguladora de Energia e Saneamento Básico do Estado do Rio de Janeiro (AGENERSA) enviou fiscais para apurar os fatos e notificou a concessionária.
A AGENERSA esclareceu que o Regulamento dos Serviços de Abastecimento de Água e Esgotamento Sanitário veda a suspensão do serviço de esgoto se esta gerar danos ambientais e que tal conduta implica em penalidade de multa.
Em nota oficial enviada ao Diário do Rio, a Águas do Rio negou a denúncia, afirmando que “hoje não há imóvel algum com o serviço de esgoto cortado” e que a situação citada na matéria tratava-se de “uma questão pontual de um cliente cortado, que declarou não estar mais consumindo água da rede de abastecimento”.
No entanto, a reportagem do Diário do Rio informou ter enviado formalmente à AGENERSA os dois endereços onde o bloqueio ocorreu, além de fotos e vídeos comprovando o uso da “rolha de bosta”.
Informações Via Diário do Rio


Deixe a sua opinião sobre o post