Dia 30 de abril (Dia da Baixada) e 01.º de maio (Dia do Trabalhador): para comemorar, refletir e lutar por direitos
1 de maio de 2025

Nesta semana comemoramos dias importantes para nossa região e para a sociedade como um todo. No dia 30 de abril celebramos o Dia da Baixada Fluminense, data que foi oficializada pelo decreto 3822 de 2 de maio de 2002. Essa data é desconhecida por grande parte dos seus moradores. Já o 01.º de maio, imagino que seja amplamente conhecida, pois comemora-se o Dia Internacional dos Trabalhadores e é marcado por um feriado em escala nacional.

O que muito me chama a atenção é que existem algumas coincidências que estão para além da proximidade das duas datas. A primeira tem relação com a história de construção simbólica das referidas agendas em nosso calendário, que se articula em uma tríade: circulação, trabalho e direitos.

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Imaginamos que muitos saibam, mas lembramos que o dia 01.º de maio foi definido como data simbólica do Dia do Trabalhador em homenagem às lutas dos trabalhadores no século XIX, sobretudo no evento de Chicago no ano de 1886 na chamada revolta de Haymarket, na qual os trabalhadores foram reprimidos de forma brutal. No cerne das suas lutas estavam, entre outras questões, a busca por melhorias das condições de trabalho e a redução da jornada laboral para 8 horas diárias. Portanto essa data ela é mais do que reconhecer um dia de descanso para milhares de pessoas que fazem a engrenagem do capital girar. Ela é o dia de reconhecer os desafios de manutenção dos direitos das grandes massas que ocupam os nossos territórios e que em sua maioria mora nas grandes periferias metropolitanas do mundo.

A Baixada Fluminense é essa periferia, como tantas outras, que abriga grandes contingentes de trabalhadores que em sua luta diária circulam de forma exaustiva no espaço metropolitano (na mobilidade casa-trabalho) em busca de garantir o seu sustento. Gosto sempre de lembrar que a Baixada é uma região que existe simbolicamente no imaginário fluminense marcada por uma representação hegemônica de pobreza, miséria, violência social e ausência de direitos. Essa imagem se consolidou ao longo do século XX juntamente com a inserção de seus municípios como parte da periferia metropolitana do Rio de Janeiro. Apesar disso, a Baixada não se limita há uma simplificação de lugar de pobreza. Por exemplo, ela também possui uma grande riqueza natural abrigando várias unidades de conservação, além disso possui um grande potencial histórico-cultural.

Há na região inúmeros grupos culturais, institutos de pesquisa – alguns ligados a universidade, outros formados por associações em que moradores –, fazedores de cultura, ativistas sociais, trabalhadores da educação, entre outros, que participam ativamente da (re-)construção da história e da imagem desse lugar. A legitimidade reconhecida para comemoração do Dia da Baixada é fruto da luta dessas pessoas, que com suas visões sobre essa periferia a reconheceram como potência. Reconhecer um Dia da Baixada é reconhecer o direito a sua própria memória, mas também o de luta pelos direitos que são vilipendiados. Entre estes muitos direitos a serem plenamente conquistados estão aqueles relacionados a circulação e o trabalho.

O que me chama atenção é que a escolha do dia 30 de abril como dia da Baixada Fluminense traz o simbolismo da inauguração da primeira linha férrea do Brasil, Inaugurada em 1854 pelo então Barão de Mauá. Essa estrada ligava o Porto de Mauá (Estação Guia de Pacobaíba) em Magé até Fragoso. O trem representava o elemento técnico que materializaria o progresso, o desenvolvimento. Era a modernidade chegando às terras da Baixada!

Porém, lembrarmos que essa modernidade que chega à nossa região no século XIX não tinha a pretensão original do transporte de trabalhadores, mas das cargas e mercadorias que se produziam aqui.  Um bom exemplo para isso é recordar que o atual ramal Belford Roxo tem herança do traçado do antigo ramal Rio Douro. Esse era conhecido como Trem das Águas, que foi construído para o transporte das águas oriundas da baixada até o Rio de Janeiro. Outro exemplo é uma coincidência, o nome Maxambomba, que originava uma das estações a atual estação de Nova Iguaçu, na linha do ramal Japeri, tem origem numa adaptação da palavra inglesa – uma corruptela do termo “machine pump”, que designava os mecanismos sobre trilhos destinado a carregar embarcações ou uma pequena locomotiva.

Quero ainda lembrar que a estrutura de formação urbana da maior parte dos municípios da Baixada Fluminense é atravessada pela linha férrea. Os centros e centralidades de números municípios coincidem com estações das linhas de trem.

A partir desse pequeno resgate da relação com trem e a Baixada Fluminense poderíamos ser tentados a pensar que hoje a região teria uma ótima condição de circulação e mobilidade na metrópole. Todavia a realidade se apresenta desta forma. Estudos sobre mobilidade, tempo de deslocamento dos trabalhadores e os custos envolvidos na circulação cotidiana revelavam que a Baixada Fluminense tem dos piores indicadores do Brasil.

          Lembrar os dados do censo 2010 que indicavam os municípios da Baixada como aqueles em que seus moradores levavam mais tempo no deslocamento casa-trabalho, e entre esses municípios estavam Japeri, Magé, Nova Iguaçu, Queimados e Belford Roxo. Estudos revelavam que os trabalhadores de Japeri levavam em média 2 horas nesse deslocamento, ou seja, diariamente gastavam 4 horas de deslocamento. Se pensarmos que esse trabalhador exerce, ao menos, 8 horas de trabalho diários, veremos que se que utiliza 50% a mais de seu tempo de jornada produtiva no deslocamento casa trabalho. Se não bastasse o tempo de deslocamento, estudos realizados pela Casa Fluminense revelam que em muitas cidades da Baixada Fluminense o trabalhador chega a arcar entre 30% e 35% do salário-mínimo com o transporte.  Esse é o caso de Belford Roxo, onde cerca de 177 mil pessoas comprometem cerca de 30% do salário-mínimo para custear o transporte. A complexidade é ainda maior se pensarmos no desafio que é a mobilidade dentro da própria periferia, seja se deslocando de um bairro a outro ou de um município a outro na Baixada. É importante destacar que muitos desses deslocamentos é realizado de forma autônoma ou por redes de transportes alternativos. Outro fator relevante é a inconstância e os recorrentes problemas dos sistemas de transportes na região, que potencializam ainda mais o tempo de deslocamento e podem elevar os custos diários para trabalhadores estudantes e transeuntes de forma geral.

Gostaria muito de poder comemorar estes dias celebrando a revitalização do transporte ferroviário, da potencialização do transporte coletivo subsidiado pelas prefeituras no deslocamento intrabairros, na construção coletiva de propostas de integração da mobilidade em favor dos moradores desta periferia que são em grande maioria trabalhadores. Por isso, creio na necessidade de reconhecermos que a relação circulação, trabalho e direitos necessita fazer parte de nossas agendas. Penso que as datas simbólicas desta semana nos propiciam a isso!

Por: André Santos da Rocha

Professor da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro – UFRRJ

Membro do Instituto Histórico e Geográfico de Nova Iguaçu – IHGNI

 

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