Conversão de multas em investimentos vai ajudar na recuperação do meio ambiente
16 de março de 2018

Carta aberta à Presidência da República: Manifesto de apoio ao mecanismo conversão de multas ambientais em serviços de recuperação da vegetação nativa, com base nos princípios de participação, transparência e monitoramento.

Ao Excelentíssimo senhor Presidente da República Federativa do Brasil, Michel Miguel Elias Temer Lulia.

Esta carta é assinada por coletivos de instituições e pessoas que atuam para alavancar a agenda da restauração ambiental no Brasil e tem por objetivo manifestar seu pleito para que seja regulamentada a conversão de multas ambientais em serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente, prevista no artigo 72, § 4.º, da Lei nº 9.605/98, de forma a beneficiar ações de recuperação da vegetação nativa.

1) Em 16 de agosto de 2017, recebemos com entusiasmo o pronunciamento do Excelentíssimo senhor Ministro do Meio Ambiente, José Sarney Filho, sobre a proximidade da publicação de um decreto dessa natureza, apresentado pelo Instituto Brasileiro Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (IBAMA). No entanto, transcorrido mais de um mês do anúncio, não houve qualquer manifestação do Palácio do Planalto sobre o mesmo, o que tem nos deixado temerosos de que essa importante matéria tenha sido subjugada em prol de outras pautas.

2) Não há dúvida sobre os benefícios que a agenda da restauração ambiental trará ao Brasil. Não apenas por fortalecer o nosso papel de liderança internacional nos temas meio ambiente e clima, mas também pela sua capacidade de promover um novo modelo de desenvolvimento econômico e social, mais justo e inclusivo, sobre o qual possuímos enormes vantagens competitivas. Afinal, somos o país com a maior biodiversidade do planeta e o terceiro maior exportador agrícola do mundo. Um exemplo da importância do Brasil nesse cenário é a recente realização da maior conferência mundial na área de restauração ecológica em Foz do Iguaçu, que reuniu mais de 1.000 inscritos de mais de 60 países.

3) Os alicerces dessa nova agenda de desenvolvimento, pautados no propósito restaurador da natureza, têm sido construídos por milhares de praticantes, pesquisadores, economistas e empreendedores distribuídos pelo país. Diversas são as espécies nativas que demonstram potencial econômico e os modelos de produção capazes de conciliar retorno econômico e conservação da natureza, como os sistemas agroflorestais, por exemplo.

4) Além dos compromissos internacionais assumidos pelo Brasil nas agendas de clima e biodiversidade, existe também a obrigatoriedade de recuperar as áreas de preservação permanente e reserva legal, prevista na Lei nº 12.651/12. No entanto, a morosidade para se alavancar ações concretas nesse sentido tem afetado negativamente a cadeia de valor associada, uma vez que centenas de viveiros, grupos de produtores de sementes e empresas especializadas em restauração têm cessado suas atividades no país.

5) É inegável o papel do Estado no fortalecimento de agendas estratégicas. Assim como as monoculturas da cana-de-açúcar e soja foram alavancadas pelo Proálcool e Embrapa-Soja, a agenda da restauração carece de políticas públicas estruturantes e investimentos para que alcance o seu esperado papel no contexto nacional.

6) Na linguagem da Ecologia, restaurar significa tomar as ações necessárias para ajudar os ecossistemas degradados a recuperarem as funções, estrutura e espécies perdidas. Neste sentido, garantir os meios legais para viabilizar a efetiva e transparente conversão das multas por danos ambientais em ações de recuperação da vegetação nativa é uma ação restauradora urgente e necessária, além de extremamente justa.

7) O atual mecanismo de cobrança de precatórios por danos ambientais é falho e moroso. Menos de 3% dos 23 bilhões de reais das multas aplicadas foram pagos e existem processos dessa natureza que tramitam na justiça há mais de 15 anos.

8) É fundamental que a regulamentação da conversão de multas em serviços de recuperação da vegetação nativa traga celeridade a esse processo. Esperamos que o instrumento considere e promova a participação da sociedade civil na tomada de decisão sobre as prioridades de sua aplicação, bem como de mecanismos que garantam sua transparência e ferramentas de monitoramento que possam aferir a efetividade desses investimentos para com seu objetivo final, além de garantir o princípio constitucional da reparação integral dos danos ambientais.

9) Com base nos princípios de participação, transparência e monitoramento, esperamos que a regulamentação tenha potencial de dar celeridade às ações de recuperação da vegetação nativa por meio de uma clara, transparente e efetiva conversão de multas em serviços. Com isso, grupos de produtores de sementes, viveiros e demais empreendedores da cadeia de valor podem se fortalecer, voltar a atuar e se multiplicar, gerando empregos, renda, regularização ambiental de propriedades rurais e novas tecnologias, que por sua vez, podem reduzir o custo dessa atividade e pavimentar o caminho para a nova economia da restauração. Ainda, o mecanismo de conversão de multas em serviços pode ser uma alternativa interessante para a regularização de infratores. Do mesmo modo, também cumprirá a função de dissuadir terceiros de praticar a infração, fortalecendo, assim, seu caráter pedagógico.
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10) Compreendemos que os recursos oriundos da conversão de multas não serão suficientes para atender toda a demanda de recuperação da vegetação nativa brasileira. No entanto, esses serão importantes para quebrar a inércia na qual o tema se encontra atualmente e para alavancar outros recursos e ações necessárias ao seu progresso na escala esperada.

Por fim, esperamos contar com a atenção e empenho da Presidência para garantir a relevância estratégica dessa matéria para o país. Os coletivos signatários desta carta estão à disposição para colaborar na construção de uma agenda positiva em prol da restauração e solicitam uma audiência com o Excelentíssimo senhor Ministro-chefe da Casa Civil da Presidência da República para tratar sobre o tema.

Cordialmente,

Aliança pela Restauração na Amazônia (55 instituições associadas) Aliança Cerrado (60 instituições associadas) Atores da Restauração do Vale do Paraíba (150 membros) Comitê Técnico de Sementes Florestais da Associação Brasileira de Sementes (21 pesquisadores associados) Núcleo de Estudos em Agricultura Familiar (NESAF) (15 instituições e associações de produtores rurais associados) Núcleo de Estudos e Pesquisas em Recuperação de Áreas Degradadas (NEPRADE) (8 pesquisadores associados) Pacto pela Restauração da Mata Atlântica (270 instituições associadas) Rede Campos Sulinos (30 grupos de pesquisa associados) Rede Cerrado (300 instituições associadas) Rede de Sementes da Mata Atlântica (23 pesquisadores e 4 grupos de coletores de sementes) Rede de Sementes do Cerrado (42 associados) Rede de Sementes do Xingu (450 produtores de semente) Rede Rio São Bartolomeu de Mútua Cooperação (10 comunidades rurais) Sociedade Brasileira de Restauração Ecológica (SOBRE) (200 pesquisadores associados) #MaisFlorestaPRASaoPaulo (7 instituições envolvidas)