Histórias do Brasil: Por que o Brasil foi o ultimo país a abolir a escravidão?
17 de junho de 2025

Essa é uma confusão muito comum. Quando falam na abolição no Brasil o pessoal sempre fala que o Brasil foi o último país a acabar com a escravidão. Mas essa afirmativa está errada, a não ser que você especifique que foi o último país da América (ou mesmo do mundo ocidental) a fazê-lo. Aí a afirmativa passa a estar correta.

Mas quando você não especifica o último de quê (como o autor da pergunta fez por exemplo) você dá a entender que o Brasil foi o último país DO MUNDO a acabar com a escravidão. Aí a afirmativa torna-se totalmente errada. O último país do mundo a abolir a escravidão foi a Mauritânia, um país africano (que pode soar como um paradoxo para muitos BRs). A Mauritânia o fez apenas em 1981, quase 100 anos depois do Brasil (93 pra ser mais exato). Além da Mauritânia, outros 10 países pelo mundo aboliram a escravidão depois do Brasil.

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Foram a Tunísia em 1890 (que na época era um protetorado francês), a Gâmbia em 1894 (que era uma colônia britânica), Madagascar (colônia francesa) em 1897, a China imperial em 1906, Serra Leoa (colônia britânica) em 1928, Nigéria (colônia britânica) em 1936, Etiópia (país já independente) em 1942, a Alemanha após a derrubada do regime nazi em 1945, o Marrocos (já independente) em 1956 e a Arábia Saudita em 1962. Isso falando só nos países que aboliram a escravidão. Hoje em dia ainda há países onde a escravidão ainda é legal. Dois exemplos são a Coreia do Norte e o Estado Islâmico (ISIS) – se é que podemos considerar o ISIS como país.


Mas corrigindo a pergunta para “Por que o Brasil foi o último país DAS AMÉRICAS a abolir a escravidão?”, é porque no nosso caso a situação era mais complexa. Era mais complicado abolir a escravidão no Brasil do que em outros países. Por diversas razões históricas (nas quais não entrarei em muitos detalhes), a quantidade de escravos era muito grande e toda a economia e sociedade brasileiras dependiam da mão de obra escrava – em 1822, 30% da população do Brasil era cativa. Era diferente do caso argentino por exemplo, onde nunca teve muitos escravos e o país nunca foi muito dependente de mão de obra cativa. Na situação da Argentina era muito mais fácil a abolição.

No caso BR, abolir a escravidão repentinamente e de qualquer maneira faria o país implodir. A nossa economia iria colapsar e o sistema político desestabilizaria e o caos e a anarquia iriam tomar de conta. O nosso caso infelizmente exigia calma e paciência, exigia que a gente analisasse a situação com mais cuidado e sem pressa. Era uma situação que exigia pragmatismo por parte do governo. As autoridades políticas tinham que bolar um jeito de acabar com a escravidão causando o mínimo possível de efeitos colaterais.

Por exemplo, os americanos (que estavam em uma situação não muito diferente da do Brasil) não pensaram nisso e tentaram abolir a escravidão de maneira brusca. Resultado: Embora tenham acabado com a escravidão mais cedo que a gente pra isso eles tiveram que passar pela guerra civil, que quase apagou os EUA do mapa antes que ele tivesse a oportunidade de virar superpotência mundial. Mesmo com o fim da escravidão, a guerra civil gerou ainda mais ressentimentos entre brancos e negros nos EUA de forma que lá racismo é muito comum (ao menos mais comum que no Brasil) e continuou institucionalizado por muito tempo através das “Jin Crow Laws”. Isso sem falar no surgimento da KKK.

Os políticos brasileiros desde a independência estavam cientes que a abolição era necessária e tinha que acontecer mais cedo ou mais tarde, de um jeito ou de outro. O próprio imperador Dom Pedro I por exemplo chegou a dizer uma vez:

“Eu sei que o meu sangue é da mesma cor que o dos negros.

Os britânicos desde a independência vinham pressionando o Brasil constantemente pra acabar com a escravidão – não por altruísmo dos ingleses mas sim porque eles viram vantagens econômicas pra eles nisso. Teve vezes que navios de guerra da marinha britânica chegaram a atacar navios de bandeira brasileira e quase houve guerras entre os dois países por causa de certas questões como a da abolição (vide questão Christie por exemplo). Mas como já dito, no caso brasileiro a abolição não era um problema tão simples de se resolver na prática. Não era algo que a gente poderia fazer apenas com um estalar de dedos como os ingleses queriam. Exigia pragmatismo e calma.

Teve vezes que o governo brasileiro teve que fingir ter abolido a escravidão levando os ingleses em banho Maria. É até daí que surgiu a expressão popular BR “pra inglês ver”. Refletindo sobre a condição dos negros e desabafando sobre querer fazer algo pra acabar com a escravidão mas na prática ser algo complicado de se realizar mesmo para um imperador, Dom Pedro I chega a dizer:

“Não há desgraça maior do que querer fazer as coisas certas e consertar tudo, mas não possuir os meios para isso.”[1]

Pedro I do Brasil

Vendo o caso americano, que era um exemplo que mostrava que não era boa ideia abolir a escravidão de qualquer jeito sem pensar e repensar como fazer antes, os políticos brasileiros optaram por fazer da abolição um projeto de longo prazo. Ela seria feita com calma indo de pouco a pouco dando tempo pro país se readaptar à nova realidade que viria. Seguindo essa política, demorou para a abolição chegar, bem mais que no resto do continente. Mas ao menos ela veio com o mínimo possível de efeitos colaterais. O único efeito colateral que é relevante citar foi só a queda da monarquia em favor da república em 1889 (logo no ano seguinte à abolição). Mas mesmo a queda da monarquia ocorreu de maneira relativamente pacífica, sem derramamento de sangue – diferente de outros casos pelo mundo.

Notas de rodapé

 
Fonte: Quora
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