Conheça a História da Cultura Negra na Ilha da Marambaia
1 de agosto de 2021

Este primeiro vídeo realizado pela TV Jaguanum em parceria com o Seropédica Online faz parte de um Documentário que será realizado até o final deste mês sobre a Cultura Negra na Ilha de Marambaia em Mangaratiba. 

 Comunidade Quilombola da Ilha de Marambaia

Por volta de 1850, o governo brasileiro, pressionado pela Inglaterra, promulgou a lei Eusébio de Queirós proibindo o tráfico negreiro e autorizando a expulsão dos traficantes do país. Essa lei, contudo, não aboliu a escravatura, o que só seria alcançado 38 anos depois, mantendo parte significativa do setor cafeeiro calcada na mão de obra escrava. Sendo uma resposta a pressões e externas e não resultado de um processo político interno, esta lei não se mostrou efetiva de uma hora para outra. Sob a condescendência de parte das autoridades imperiais, grandes proprietários de terra continuaram a trazer escravos da África para realizar o trabalho em suas lavouras, especialmente na cultura do café.

No estado do Rio de Janeiro, um dos maiores cafeicultores e traficante de escravos era Joaquim José de Souza Breves, também conhecido como Comendador Breves. Este grande proprietário de terras possuía grande influência na então capital do país, motivo pelo qual não encontrou resistência das autoridades quando, em 1856, instalou na Ilha da Marambaia, na baía de Sepetiba, entre os municípios de Mangaratiba (à qual pertence) e Rio de Janeiro, uma fazenda de engorda de escravos trazidos irregularmente da África. As longas viagens marítimas intercontinentais, aliadas às péssimas condições a bordo dos navios negreiros, davam cabo de pelo menos 40% dos escravos embarcados na costa africana. Aqueles que alcançavam o Brasil chegavam aqui, em geral, doentes e debilitados, motivo pelo qual o Comendador Breves os mantinha durante alguns meses nesse entreposto, a fim de que se recuperassem antes de seguirem para as fazendas de café do comendador ou serem vendidos nos mercados.

Esta situação permaneceu até 1888. Nesse ano, o governo imperial, pressionado pelo forte movimento abolicionista que vinha se fortalecendo no país nas décadas anteriores, assinou a chamada Lei Áurea, abolindo o regime escravocrata no país. Desde 13 de maio daquele ano, todos os negros do país eram considerados homens livres. No ano seguinte, o comendador Breves abandona a Marambaia, distribuindo as praias da ilha e deixando-a para as famílias dos ex-escravos que lá permaneciam. Abandonadas à própria sorte, as famílias se organizam em torno da atividade pesqueira e da agricultura de subsistência, explorando coletivamente os recursos naturais da ilha, constituindo sua própria estrutura social.

Todavia, o legado deixado pelo comendador foi transmitido de maneira informal, motivo pelo qual dois anos depois, Dona Isabel de Moraes Breves, viúva e herdeira da Ilha, vende-a à Companhia Promotora de Indústrias e Melhoramentos, que não chega a exercer qualquer tipo de atividade na Marambaia, repassando-a à União em 1905.

Nos 70 anos seguintes, a ilha irá passar por diversas transformações. Entre 1908 e 1910 funcionou no local a Escola de Aprendizes de Marinheiros. Com a transferência dela para o município de Campos dos Goytacazes, os quilombolas se tornaram novamente os únicos senhores do lugar até 1939, quando é criada a Escola Nacional de Pesca. O período de funcionamento da escola de pesca é lembrado pelos moradores mais antigo como a “era de ouro” da ilha. Além de uma ampla rede educacional, com cursos regulares e profissionalizantes, barcos, posto de saúde e toda uma infraestrutura permitiam certo conforto aos moradores, mesmo que estes continuassem a viver de modo tradicional em suas praias.

Por volta de 1970, a Escola Nacional de Pesca foi fechada e a administração do local foi repassada à Marinha do Brasil. A ilha passa a ser considerada uma área de segurança nacional, e os moradores, a sofrer uma série de restrições. A infraestrutura outrora existente é desativada, e as relações entre a comunidade e o continente passam a ser intermediadas pela Marinha. O relacionamento entre comunidade e a Marinha piora a partir de 1981, quando é instalado o Centro de Adestramento da Ilha de Marambaia (CADIM). Os treinamentos realizados na ilha passam a trazer transtornos à comunidade. Isto exarceba os conflitos já existentes.

A Marinha passa então a pressionar a comunidade, restringindo visitas, proibindo o cultivo de roçados, proibindo a reforma ou construção de casas . Os filhos casados dos quilombolas são obrigados a optar entre morar na casa de seus pais ou constituir residência no continente. Além disso, os treinamentos colocam a vida dos moradores em risco ao utilizarem munição real em muitos treinamentos ou a utilizar os roçados remanescentes como fonte de alimentos para treinamentos de sobrevivência na mata.

A partir de 1990, o alto comando do CADIM passa a mover ações de despejo contra os quilombolas. a fim de expulsá-los da ilha. Essas ações são movidas individualmente contra cada morador processado, em várias varas diferentes, a fim de evitar a caracterização dos processados enquanto comunidade. Além disso, a Marinha se aproveita de autorizações informais para construção ou ampliações de residências para caracterizar danos ao patrimônio da União pelos “invasores”. Muitos quilombolas perdem o direito de moradia nessas ações.

Mobilizados pelas ações de despejo, os quilombolas esboçam as primeiras tentativas de resistência à expulsão de suas terras. Em 1998 é fundada a Associação para o Desenvolvimento Socioeconômico Cultural da Ilha da Marambaia, mas, assim como tentativas anteriores de organização da comunidade, essa associação não consegue articulares os diversos núcleos familiares e não alcança seus objetivos.

A situação começa a mudar a partir de 2002, quando a atuação do Ministério Público Federal garante a assessoria jurídica necessária para realizar a defesa da comunidade. No ano seguinte, é fundada a Associação dos Remanescentes de Quilombos da Ilha de Marambaia (ARQIMAR), através da qual os moradores passam a articular a luta por seu reconhecimento enquanto comunidade remanescente de quilombos e pela titulação de suas terras.

É também a partir da ARQUIMAR que os moradores da ilha da Marambaia iniciam articulações com ONGs, redes e outros representantes da sociedade civil organizada. Esses novos aliados têm propiciado aos quilombolas a visibilidade que a atuação da Marinha lhes nega e os meios de fazer com que suas demandas sejam consideradas. Desde 2004, a Fundação Cultural Palmares (FCP) os reconhece como remanescentes de quilombo, e o INCRA tem conduzido um extenso processo administrativo a fim de garantir a titulação das terras da comunidade.

 

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